Pode faltar cerveja por conta da crise climática?
Pode faltar cerveja por conta da crise climática? Recentemente, o CEO da cervejaria japonesa Asahi manifestou toda a sua preocupação com o clima em entrevista ao jornal britânico Financial Times. Pesquisas mostram impactos nas matérias-primas.
Como está o tempo aí? Muita chuva, muito calor? O mês de outubro de 2023 foi o mês mais chuvoso da história do Rio de Janeiro e de São Paulo. Já a onda de calor que atingiu o Sudeste e Centro-Oeste em novembro fez a capital carioca registrar recorde na sensação térmica, com 59,3 °C no dia 17, e temperatura mais alta da história com 42,5 °C no dia 18. Na capital paulista, foram dois dias seguidos do “super-calor”, com 37,7 °C nos dias 13 e 14. Essas são a segunda e a terceira maior temperatura da história da cidade. Será que o clima ficou maluco?
Eu sei. Nesse ponto você já deve estar se perguntando se não acessou um boletim meteorológico por engano. Mas o assunto é cerveja sim. Ou melhor, a bebida no contexto do aquecimento global enfatizado pelo El Niño, especialmente forte deste ano. E se você acha que uma coisa não tem nada a ver com a outra, saiba que pode faltar cerveja se não cuidarmos do meio ambiente do nosso planeta.
Recentemente, em setembro, o CEO da cervejaria japonesa Asahi, Atsushi Katsuki, manifestou toda a sua preocupação com o clima em entrevista ao jornal britânico Financial Times. Ele destacou que em temperaturas quentes, bebemos mais cerveja e, ao mesmo tempo, essas mesmas mudanças climáticas prejudicam a produção de cevada e lúpulo.
Ou seja, se a gente não cuidar do planeta, pode faltar cerveja justo quando estamos com mais sede.
Cerveja é um produto agrícola
Estamos tão acostumados a buscar nossa cerveja nos mercados e bares que quase esquecemos que cerveja é um produto agrícola. Não que você vá encontrar campos de Pilsen ou árvores de IPA, mas as matérias-primas básicas vem do campo.
O lúpulo é especialmente suscetível às mudanças climáticas. Nos últimos dez anos, por exemplo, o consumo e a produção da planta cresceu muito com as cervejas artesanais explorando cada vez mais as características de aroma e sabor dela. No entanto, aquecimento mundial pode afetar a quantidade de chuvas. E, sendo uma planta que consome muita água, ela pode ter queda na produtividade se o solo ficar muito seco. Já o frio é essencial no período de hibernação da planta (inverno e outono), possibilitando a produção das substâncias amargas. Com o calor desproporcional, a concentração delas pode cair bastante.
Essas são as conclusões de dois estudos envolvendo a planta. O primeiro, encomendado pela Asashi, mostra que o aquecimento pode diminuir a produção entre 13% e 25% na República Checa, um dos principais produtores mundiais. O segundo, publicado pela Nature Communications, enfatiza a queda na produção de substâncias amargas e de aroma no contexto europeu.
Já o malte é feito a partir da germinação controlada e secagem da cevada, principalmente. O aumento no calor pode multiplicar o número de doenças na espiga dos grãos, tornando o cereal impróprio para o uso na cerveja. Se esse calor vier acompanhado do aumento de chuvas, um outro cenário possível, pode ocorrer a germinação precoce dos grãos ainda no campo, o que o inutiliza para a malteação.
Essa é a análise de Aloisio Alcantara Vilarinho, pesquisador de genética e melhoramento da cevada da Embrapa Trigo em entrevista ao Guia da Cerveja. No entanto, diz o especialista, é possível que os cultivares do cereal utilizados hoje sejam paulatinamente substituídos por outros mais resistentes às novas condições.
Cuide do planeta, ele é o único que tem cerveja!
A frase acima é uma brincadeira comum no meio cervejeiro. Uma frase de autor desconhecido que talvez nunca tenha sido tão verdadeira: é preciso cuidar do meio ambiente. Para tudo. Mas também por conta da cerveja. De fato, as mudanças climáticas podem afetar a bebida, impactando a produção de matérias-primas. No entanto, não há um cosseno ainda se isso vai gerar necessariamente uma diminuição da produção ou uma mudança estrutural no produto. De uma forma ou de outra, é sempre melhor prevenir do que remediar.
O que você tem feito para cuidar do planeta?